Durante três dias, os representantes assistiram painéis e trabalharam com tutoriais e atividades práticas para desenvolver projetos de big data.
Estamos vivendo a era da inovação baseada em dados. Humanos e máquinas geram e fornecem um volume cada vez maior de informações que necessitam de tratamento e análise para que sejam revertidas em ações de bem estar social e desenvolvimento econômico. Nesse contexto, representantes de diferentes setores – Governo, empresas, academia e sociedade civil – reuniram-se por três dias para debater conceitos relacionados a big data e aprender a operacionalizar projetos por meio de parcerias entre usuários e produtores de dados voltados ao interesse público.
Organizado pela Data-Pop Alliance, pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe das Nações Unidas (CEPAL) e pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), o workshop “Big Data para medição da Economia Digital” aconteceu de 26 a 28 de setembro, na sede do NIC.br, em São Paulo. Painéis, apresentações, trabalhos em grupo e tutoriais técnicos marcaram o encontro.
Visando desenvolver habilidades para a compreensão de aspectos conceituais, técnicos, metodológicos, políticos e éticos por trás do paradigma de big data e seu impacto para o desenvolvimento socioeconômico, o workshop focou em atividades práticas, percorrendo desde a concepção de um projeto de big data até o uso de ferramentas de programação e visualização de dados. Além dessas atividades, o evento trouxe painéis com renomados especialistas da área que contribuíram para refletir sobre as diversas questões envolvidas no uso de big data.
No primeiro dia, o workshop teve a participação de Emmanuel Letouzé (Data-Pop Alliance) em apresentação sobre as políticas, sociedades e alfabetização na era do big data, enquanto Wilson Peres (UNECLAC) abordou os impactos da transformação digital, inteligência artificial e robótica.
“Temos grandes desafios, problemas metodológicos para utilizar dados orgânicos (ou big data) na produção de estatísticas, de acesso aos dados de empresas privadas, especialmente de redes sociais e operadoras de telefonia, e da capacitação de profissionais para coletar, tratar, entender e tirar o melhor proveito dos dados”, destacou Alexandre Barbosa (NIC.br/Cetic.br), responsável por moderar o primeiro painel que tratou do “Ecossistema de Big Data no Brasil”.
O cenário brasileiro e a importância das políticas públicas – entre elas, a Estratégia Brasileira para a Transformação Digital e o Plano Nacional de Internet das Coisas – foram comentadas por Miriam Wimmer (MCTIC) durante o encontro. “Quando discutimos governo, dado é uma questão central. Precisamos, por um lado, aprender como usar o big datapara políticas públicas e, por outro lado, criar um ecossistema de segurança jurídica para empresas”.
Denise Silva (ENCE/IBGE) pontuou que, para aprimorar as estatísticas a partir do big data, é necessário que todos os brasileiros tenham acesso à rede. “Temos diferentes tipos de dados que não são produzidos para elucidar questões sociais. Precisamos combinar dados de várias fontes para ter o cenário completo e isso não é fácil.”
Dados processados em larga escala, distribuição e velocidade requerem novos paradigmas, lembrou Prof. Eduardo Francisco (FGV). Do ponto de vista da academia, projetos de pesquisa de big data envolvem desde experimentação de algoritmos, criação de novas técnicas, machine learning e deep learning, além do uso de novos dispositivos como drones e nano satélites. “Outras áreas como administração de tecnologia da informação, estratégia comportamento organizacional tendem a evoluir. Big Data será capaz de elucidar como lidar com culturas diferentes, como usar melhor uma informação e dados geográficos”, afirmou.
Paschoal D’Auria (IBM Brasil) apresentou a perspectiva do setor privado, reforçando o potencial de campanhas de marketing com precisão cirúrgica. “Big Data é sobre execução e personalização. Deve ser utilizado para trazer resultado, auxiliar na tomada de decisão e agregar valor de maneira rápida e fácil”, pontuou. Já Natalia Mazotte (Escola de Dados) trouxe exemplos do uso de dados em projetos nas áreas de saneamento, educação e recursos públicos. “Quando empoderamos a sociedade civil para o uso dos dados, podemos produzir resultados muito interessantes para a democracia.”
Experiências locais
Big Data é a chave para criar e aprimorar um amplo espectro de serviços. No segundo painel, “Big Data para medir a economia digital – experiências locais”, moderado por Alejandro Patiño (CEPAL), o professor Wagner Meira Jr. (UFMG) comentou sobre o projeto “Observatório da Dengue” que, a partir da extração de dados das redes sociais, permitiu detectar locais com epidemias de dengue no Brasil. “Coleta e tratamento dos dados, baixa qualidade das informações, ausência de uma cultura de tomada de decisão baseada em dados, concentração de mercado, parcialidade e falta de transparência são desafios atuais.”
Karin Breitman (Association for Computing Machinery) lembrou que os problemas são sinônimos de oportunidades. Ela explicou como um projeto de análise de dados para entender a mobilidade na cidade do Rio de Janeiro possibilitou a racionalização do uso de ônibus e redução da frota. “Como posso reduzir ineficiências para economizar dinheiro? Isso é onde big data pode ajudar”. O Prof. Silvio Meira (Porto Digital) reforçou que as possibilidades futuras do big data são infinitas. “Estamos entrando no domínio da IoT (Internet of Things), mas teremos verdadeiramente a IoE (Internet of Everything). Iremos conectar coisas que não estamos nem pensando agora e teremos o desenvolvimento de novas formas de organizações”, destacou.
Já as experiências do uso de big data na cidade de São Paulo foram apresentadas no encontro a partir das participações de Daniela Swiatek (Mobilab) e Fernando Nogueira (Prefeitura de São Paulo). Daniela destacou o trabalho do Mobilab na parceria com startups para o desenvolvimento de soluções voltadas ao governo e aos cidadãos. “Dados e sensores, sistema de venda de ingressos, geolocalização de taxi e ônibus privados, radares, controle de semáforos e câmeras de circuitos de segurança são fontes de informações importantes”, elencou. Fernando Nogueira (Prefeitura de São Paulo) chamou atenção para “o desafio de equilibrar conquistas rápidas e permanentes, considerando o cenário de descontinuidade de governos”. Ele lembrou que muitas bases de dados foram construídas a partir de visões burocráticas, sem contemplar as necessidades dos cidadãos. Na ocasião, Nogueira também apresentou o projeto da Prefeitura de mapeamento de locais de risco de alagamento.
Proteção de dados
“Privacidade é cada vez menos sobre as preferências pessoais e cada vez mais sobre o controle de nossas próprias vidas”, alertou Prof. Danilo Doneda (UERJ), no terceiro painel, “Estrutura jurídica para uso ético de dados no Brasil”, moderado por Tatiana Jereissati (NIC.br/Cetic.br). “Se o dado existe, ele será usado para todos os propósitos, bons e ruins. Temos a responsabilidade de entender as consequências decorrentes do mal uso dos dados, situações que podem resultar em preconceitos e discriminação, e proteger os indivíduos”, destacou Doneda, reforçando que a proteção de dados é um direito fundamental.
“Como a lei pode limitar o uso de big data se a tecnologia foi concebida para expandir esse uso?”, questionou Bruno Bioni (Assessoria Jurídica do NIC.br). Ele alerta para a dicotomia ilusória entre dados pessoais e dados anônimos, uma vez que avanços tecnológicos permitem a identificação de indivíduos a partir da análise de poucas informações.
“Que tipo de política regulatória deve ser implementada para o uso ético dos dados? Os cenários e eventos são imprevisíveis. Precisamos de uma co-regulação em que todos os stakeholdersdevem medir, administrar e controlar os riscos”, opinou. Em vez de ações punitivas, Bioni defende que as boas práticas devem ser premiadas, a exemplo de produtos que considerem a privacidade by design.
Thiago Tavares (CGI.br/Safernet Brasil) chamou atenção para a transparência dos algoritmos. “Não temos ideia de como os dados são processados e nem como os algoritmos funcionam. Isso acontece por duas razões: a falta de uma lei de proteção de dados pessoais e pela confidencialidade no mundo dos negócios”, analisou. Thiago reforça que essa questão deve ser discutida de maneira que preserve a propriedade intelectual. “É importante que os algoritmos entendam a diferença entre os tipos de dados – bons e ruins – para que a inovação seja fomentada”.
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